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domingo, 16 de dezembro de 2012


EM TORNO DA PAZ

O relógio tilintou, marcando oito horas, quando Anacleto Silva acordou na manhã clara.

Lá fora, o Sol prometia calor mais intenso e a criançada disputava bagatelas como vaga chilreante de passarinhos.

Anacleto estirou-se no leito, relaxando os nervos, e, porque iniciaria o trabalho às nove, antes de erguer-se tomou o Evangelho e leu nos apontamentos do Apóstolo João, capítulo catorze, versículo vinte e sete, as sublimes palavras do Celeste Amigo:

A paz vos deixo, a minha paz vos dou. Não vo-la dou à maneira do mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize.

- “Alegro-me na certeza de que a paz do Senhor envolve o mundo inteiro”. Onde estiver, receberei o amor do Cristo, que assegura a tranquilidade, em torno do meu caminho.

Sei que a presença de Jesus abrange toda a Terra e que a sua influência nos governa os destinos.

Desfrutarei, assim, a paz entre as criaturas.

O Eterno Benfeitor está canalizando todas as mentes para a vitória da paz. Por isso, ainda mesmo que os homens me ofendam, neles procurarei enxergar meus irmãos que o Divino Poder está transformando para a harmonia geral.

Regozijo-me na convicção de que o Príncipe da Paz orienta as nações e que, desse modo, me garantirá o bem-estar.

Recolherei do Céu a bênção da calma e permanecerei nos alicerces do entendimento e da retidão, junto da Humanidade.

Louvo o Senhor pela paz que me envia hoje, esperando que Ele me sustente em sua paz, agora em todos os dias de minha vida.

Após monologar, fervoroso, levantou-se feliz, mas, findo o banho rápido, verificou que a fina calça com que lhe cabia comparecer no escritório sofrera longo corte de faca.

Subitamente transtornado, chamou pela esposa, em voz berrante.

Dona Horacina veio, aflita, guardando nos braços uma pequerrucha doente. Viu a peça maltratada e alegou triste:

- Que pena! Os meninos estão à solta, e eu ocupada com a pneumonia da Sônia.

Longe de refletir na grave enfermidade da filhinha de meses, Anacleto vociferou:

- Que pena? É tudo o que você encontra para dizer? Ignora, porventura, que esta roupa me custou os olhos da cara?

A senhora, sem revidar, dirigiu-se a velho armário e trouxe-lhe um costume semelhante ao que fora dilacerado.

Pouco depois, ao café, notando a ausência do leite, Anacleto reclamou, irritadiço.

- Sim, sim – explicou a dona da casa -, não pude enfrentar a fila... Era preciso resguardar a pequena...

Silva engoliu alguns palavrões que lhe assomavam à boca e, quando abriu a porta, na expectativa do lotação, eis que o sogro, velhinho, lhe aparece, de chapéu à destra encarquilhada, rogando, humildemente:

- Anacleto, perdoe-me a intromissão; contudo, é tão grande a nossa dificuldade hoje em casa que venho pedir-lhe quinhentos cruzeiros por empréstimo...

- Ora, ora... – respondeu o genro, evidenciando cólera injusta – onde tem o senhor a cabeça? Se eu tivesse quinhentos cruzeiros no bolso, não sairia agora para encarar a onça da vida.

Nisso um carro buzinou à reduzida distância, passando, porém, de largo, sem atender-lhe ao sinal.

- Malditos! Como seguirei para a repartição? Malditos! Malditos!...

Outro carro, no entanto, surgiu rápido, e Silva acomodou-se, enfim.

Mas, enquanto o veículo deslizava no asfalto, confrontou a própria conduta com as afirmações que fizera ao despertar, e só então reconheceu que ele, tão seguro em exaltar a harmonia do mundo, não suportara sem guerra uma calça rasgada; tão convicto em prometer a si mesmo o equilíbrio no Senhor, não se conformara ante a refeição incompleta; tão pronto em proclamar o seu prévio perdão às ofensas humanas, não soubera acolher com gentileza a solicitação de um parente infeliz, e tão solene em asseverar-se nos alicerces do entendimento, não hesitara em descer da linguagem nobre para a que condiz com a gíria que amaldiçoa...

E, envergonhado por haver caído tão apressadamente da serenidade à perturbação, começou a perceber que, entre ele e a Humanidade, surgia o lar, reclamando-lhe assistência e carinho, e que jamais receberia a paz do Cristo por fora, sem se dispor a recolhê-la por dentro.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
Fonte da imagem: Internet Google.

sábado, 1 de dezembro de 2012


CURIOSA EXPERIÊNCIA

João Massena, espírito extremamente dedicado aos enfermos, desde alguns anos após a desencarnação dirigia um grupo de companheiros em grande cidade, esmerando-se na plantação das ideias libertadoras do Espiritismo.

Respeitado e querido, entre aqueles que lhe recebiam a generosidade, ampliava constantemente a própria área de ação, invocado carinhosamente, aqui e ali, prestava serviços preciosos, angariando tesouros de cooperação e simpatia.

Aplicava o Evangelho, com raro senso de oportunidade, sustentava infelizes, protegia desesperados e sabia orientar o concurso de vários médicos desencarnados, em favor dos doentes, especializando-se, sobretudo, no socorro aos processos obsessivos.

Massena apoiava o grupo de amigos encarnados e o grupo apoiava Massena, com tal segurança de entendimento e trabalho, que prodígios se realizavam constantemente.

As tarefas continuavam sempre animadoras, quando surgiu para João certo caso aflitivo. Jovem destinada a importantes edificações mediúnicas jazia em casa, trancada entre quatro paredes e vigiada por Espíritos impossíveis, interessados em cobrar-lhe algumas dívidas do passado culposo. Benfeitores da Vida Maior amparavam-na; perseguidores que lhe tramavam a perda.

Prestigiado pelos poderes Superiores, Massena estudou a melhor maneira de acordá-la para as responsabilidades de que se achava investida e percebeu que, para isso, bastaria aparecesse alguém capaz de lhe excitar a memória para o retorno ao equilíbrio, alguém que falasse a ela com respeito à fé raciocinada, à crença lógica, à imortalidade da alma e à vida espiritual.

A jovem, contudo, sob a provação da riqueza amoedada, sofria a desvantagem de não precisar sair do estreito recinto doméstico e, à face disso, encontrava maior empeço para largar a si própria.

A pouco e pouco, dominada por entidades vampirizadoras, entregou-se ao vício do álcool e, quase anulada que lhe foi a resistência, permitiu que essas mesmas criaturas perturbadas lhe assoprassem a sugestão de um crime a ser perpetrado na pessoa de um parente próximo.

Conquanto reagisse, a pobrezinha estava quase cedendo à insanidade, à delinquência.

João, aflito, reconheceu o estado de alarma. A moça, no entanto, não se ausentava de casa, não recebia visitas, não recorria a leituras e ignorava o poder da prece.

Mentalmente intoxicada, tomava rumo sinistro, quando Massena descobriu algo. A infortunada menina gostava de televisão, que se lhe fizera o único meio de contato com o mundo exterior.

Porque não auxiliá-la através de semelhante recurso?

O abnegado amigo espiritual pôs-se em campo e, repartindo apelos mentais, em setores diversos, conseguiu articular providências, até que um amigo lhe aceitou a inspiração e veio ao grupo com um projeto entusiástico. Esse “projeto entusiástico” não era outra coisa senão o interesse de Massena no salvamento da jovem.

E o visitante, sob o influxo dele, fez-se veemente no tranquilo cenáculo, convidando o conjunto a aproveitar uma oportunidade que obtivera em determinado canal. Conseguira vinte minutos para assunto espírita numa televisora respeitável.

O grupo representar-se-ia, por alguns dos componentes mais categorizados, daí a quatro dias – uma sexta-feira às dez da noite -, para comentar ligeiros aspectos de mediunidade e Doutrina Espírita.

O ofertante, após anotações de jubiloso otimismo, concluiu explicando que necessitava de ajustes urgentes. Queria de imediato, o nome do companheiro decidido a falar, antes de atender a instruções de autoridades e estabelecer minudências.

Os nove companheiros, ali reunidos, não sintonizavam, porém, naquela onda de expectação fervorosa.

Lara, o diretor de maior responsabilidade, ponderou:

- Ora! Ora! O Espiritismo não precisa de televisão. Temos as nossas casas de ensino... Entretanto, coloco o assunto ao critério dos irmãos...

O recém-chegado, expressando-se por si e pelo benfeitor espiritual que o envolvia em pensamentos de esperança, ripostou:

- Sem dúvida, o templo espírita é o lar da palavra doutrinária, mas isso não nos impede de comentar os princípios espíritas, em benefício da Humanidade, seja no rádio ou na imprensa, na rua ou no salão. Se fôssemos falar acerca do bem apenas nos instintos de fé religiosa, deixaríamos ao mal campo livre, terrivelmente livre...

O judicioso apontamento, contudo, não vingou.

Delcides, comentarista inteligente da equipe, aduziu:

- Sou contra. Eu não iria à televisão, de modo algum. Considero isso pura vaidade.

Antônio Pinho, orador competente, anuiu:

- De minha parte, não tenho coragem de me entregar a semelhante exibição...

Meira, verbo seguro e visão firme, comentou, seco:

- Nem eu.

E os demais cinco ajuntaram:

- Decididamente, ir à televisão falar de Espiritismo não está certo...

- Penso de igual modo. Quem quiser aprender Doutrina Espírita, venha às reuniões...

- Eu também não poderia concordar...

- Não sou de teatro...

- O assunto esta fora de cogitação...

Encerrou-se o entendimento e o ofertante afastou-se, desapontado.

Curiosos, visitamos a jovem obsidiada, justamente na data para a qual Massena lhe previa o suspirado auxílio. Eram dez horas da noite, na sexta-feira referida, e fomos achá-la sentada à frente do vídeo.

Os minutos que seriam reservados aos comentários em torno do Espiritismo estavam sendo aplicados num festivo programa de exaltação ao uísque e, perplexos, fitamos o simpático sorriso de tele-atriz que convidava:

- Beba a nova marca! Uma delícia!...

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
Fonte da imagem: Internet Google.

sábado, 24 de novembro de 2012


CONSCIÊNCIA ESPÍRITA

Diz você que não compreende o motivo de tanta autocensura nas comunicações dos espíritas desencarnados. Fulano, que deixou a melhor ficha de serviço, volta a escrever, declarando que não agiu entre os homens como deveria; sicrano, conhecido por elevado padrão de virtudes, regressa, por vários médiuns, a lastimar o tempo perdido... E você acentua, depois de interessantes apontamentos: “Tem-se a impressão de que os nossos confrades tornam, do Além, atormentados por terríveis complexos de culpa. Como explicar o fenômeno?”

Creia, meu caro, que nutro pessoalmente pelos espíritas a mais enternecida admiração. Infatigáveis construtores do progresso, obreiros do Cristianismo Redivivo. Tanta liberdade, porém, receberam para a interpretação dos ensinamentos de Jesus que, sinceramente, não conheço neste mundo pessoas de fé mais favorecidos de raciocínio, ante os problemas da vida e do Universo. Carregando largos cabedais de conhecimento, é justo guardem eles a preocupação de realizar muito e sempre mais, a favor de tantos irmãos da Terra, detidos por ilusões e inibições no capítulo da crença.

Conta-se que Allan Kardec, quando reunia os textos de que nasceria “O Livro dos Espíritos”, recolheu-se ao leito, certa noite, impressionado com um sonho de Lutero, de que tomara notícias. O grande reformador, em seu tempo, acalentava a convicção de haver estado no paraíso, colhendo informes em torno da felicidade celestial.

Comovido, o codificador da Doutrina Espírita, durante o repouso, viu-se também fora do corpo, em singular desdobramento... Junto dele, identificou um enviado de Planos Sublimes que o transportou, de chofre, a nevoenta região, onde gemiam milhares de entidades em sofrimento estarrecedor. Soluços de aflição casavam-se a gritos de cólera, blasfêmias seguiam-se a gargalhadas de loucura.

Atônito, Kardec lembrou os tiranos da História e inquiriu, espantado:

- Jazem aqui os crucificadores de Jesus?

- Nenhum deles – informou o guia solícito. – Conquanto responsáveis, desconheciam, na essência, o mal que praticavam. O próprio Mestre auxiliou-os a se desembaraçarem do remorso, conseguindo-lhes abençoadas reencarnações, em que se resgataram perante a Lei.

- E os imperadores romanos? Decerto, padecerão nestes sítios aqueles mesmos suplícios que impuseram à Humanidade...

- Nada disso. Homens da categoria de Tibério ou Calígula não possuíam a mínima noção de espiritualidade. Alguns deles, depois de estágios regenerativos na Terra, já se elevaram a esferas superiores, enquanto que outros se demoram, até hoje, internados no campo físico, à beira da remissão.

- Acaso, andarão presos nestes vales sombrios – tornou o visitante – os algozes dos cristãos, nos séculos primitivos do Evangelho?

- De nenhum modo – replicou o lúcido acompanhante -, os carrascos dos seguidores de Jesus, nos dias apostólicos, eram homens e mulheres quase selvagens, apesar das tintas de civilização que ostentavam... Todos foram encaminhados à reencarnação, para adquirirem instrução e entendimento.

O codificador do Espiritismo pensou nos conquistadores da Antiguidade, Átila, Aníbal, Alarico I, Gengis Khan... Antes, todavia, que enunciasse nova pergunta, o mensageiro acrescentou, respondendo-lhe à consulta mental:

- Não vagueiam, por aqui, os guerreiros que recordas... Eles nada saiam das realidades do espírito e, por isso, recolheram piedoso amparo, dirigidos para o renascimento carnal, entrando em lides expiatórias, conforme os débitos contraídos...

- Então, dize-me – rogou Kardec, emocionado -, que sofredores são estes, cujos gemidos e imprecações me cortam a alma?

E o orientador esclareceu, imperturbável:

- Temos junto de nós os que estavam no mundo plenamente educado quanto aos imperativos do Bem e da Verdade, e que fugiram deliberadamente da Verdade e do Bem, especialmente os cristãos infiéis de todas as épocas, perfeitos conhecedores da lição e do exemplo do Cristo e que se entregaram ao mal, por livre vontade... Para eles, um novo berço na Terra é sempre mais difícil...

Chocado com a inesperada observação, Kardec regressou ao corpo e, de imediato, levantou-se e escreveu a pergunta que apresentaria, na noite próxima, ao exame dos mentores da obra em andamento e que figura como sendo a Questão número 642, de “O Livro dos Espíritos”: “Para agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará que o homem não pratique o mal?”, indagação esta a que os instrutores retorquiram: “Não; cumpre-lhe fazer o bem, no limite de suas forças, porquanto responderá por todo o mal que haja resultado de não haver praticado o bem.”

Segundo é fácil de perceber, meu amigo, com princípios tão claros e tão lógicos, é natural que a consciência espírita, situada em confronto com as ideias dominantes nas religiões da maioria, seja muito diferente.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
Fonte da imagem: Internet Google.

sábado, 27 de outubro de 2012


COMUNICAÇÕES

A história parece brejeira, mas o fato é autêntico.

Rafael Provenzano escutava os grandes comentaristas do Evangelho, entre despeitado e infeliz. Atormentado de inveja. Queria também falar às massas, comover a multidão. Nada lhe fulgia tanto aos olhos como a tribuna. E aguardava ansioso, o dia em que pudesse alcançar aquele ponto saliente no espaço, de onde a sua voz conseguisse impressionar centenas de ouvidos. Embora fixado à semelhante ambição, era empregado de singela sapataria. E a sua especialidade era bater pinos em sola.

Bastas vezes, surpreendia-se no trabalho, mentalizando público enorme e ele a falar, a falar sob aplausos.

Talvez por isso fosse ranzinza. Conflito permanente entre a vocação e a profissão. A família e os companheiros pagavam a diferença. A esposa e as quatro filhinhas, em casa, sofriam-lhe a teimosia e o desespero. Irritadiço, classificava-se à conta de tirano doméstico. Apurava com esmero o hábito de chacoalhar e ferir. A tensão não se limitava ao círculo mais íntimo. A parentela toda aguentava espancamentos morais. Entre amigos era temido na condição de crítico impertinente. Apesar de tudo isso, a paixão de Rafael era pregar solenemente a verdade cristã nos templos espíritas.

Certa noite, quando falava Martinho, o orientador espiritual da reunião mediúnica de que era participante, Rafael consultou o comunicante a respeito de seus velhos propósitos.

Sim, meu filho – comentou o benfeitor, através do médium -, você poderá ensinar, mais tarde, das tribunas. Agora, porém, é cedo. Convém estudar, preparar-se, aprender a servir...

E prosseguiu explicando que a banca de solador era também lugar santo. Podia demonstrar fé e abnegação pelo exemplo, edificar, inspirar, auxiliar...

Ouviu paciente, mas saiu desapontado.

Decorridas algumas semanas, o grupo se aprestava à reunião, em sala adequada. Conversa amena. Uma hora faltando para o início das orações.

Rafael chega alegre. Participa que deseja expor ao estimado Martinho o estudo de um belo sonho e contou aos circunstantes que, na noite anterior, se vira espiritualmente, fora do corpo físico. Sentira-se volitando, leve qual pluma ao vento. E contemplara aos céus um cartaz com seis letras “A.D.P.S.B.P.”, em projeção radiante. Tomara nota de tudo ao despertar.

Dona Emília, que supunha nos sonhos um constante veículo para grandes ensinamentos, inquiriu dele, quanto à conclusão a que chegara.

Pois a senhora não compreende?

Rafael explanou para o auditório interessado:

Segundo a minha intuição, as letras querem dizer: “agora deves pregar sem bater pinos”.

E acentuou que, apesar de algum sacrifício para a família, se dispunha a tentar outro emprego. Precisava de tempo livre. Se isso redundasse em privações e provações, afirmava-se pronto para o que desse e viesse. Por fim, declarou-se cansado de bater couro de boi para calçados. Aspirava a posição diferente.

No horário justo, a pequena assembleia se entregou às tarefas que, naquela noite, se vinculavam à desobsessão.

Atividades preparatórias. Preces. E começou movimentado socorro às entidades enfermas. Martinho ocupava o médium esclarecedor, que, de quando em quando, orientava os serviços, dava ideias.

Rafael pediu vez para conversar. O instrutor, contudo, recomendou-lhe esperasse. Necessário desincumbir-se de obrigações mais urgentes. Entender-se-iam no fim. Com efeito, ao término das atividades, Martinho convidou-o à palavra.

Algo tímido. Provenzano narrou o sonho, referiu-se às letras luminosas que descobrira no firmamento, como que brilhando especialmente para ele, e reasseverou os antigos desejos. Queria ser grande conferencista e prometia consagrar-se, de corpo e alma, aos ensinamentos públicos do Evangelho.

O amigo espiritual, sereno, perguntou sobre a interpretação que ele, o interessado, dera às letras.

Rafael repetiu, impávido: “agora deves pregar sem bater pinos”.

O benfeitor espiritual, todavia, pintou expressão de complacência no rosto do médium e observou:

Efetivamente, Rafael, você esteve fora do corpo de carne e viu, de fato, a mensagem do plano espiritual... Mas, engana-se, quanto ao que julga ter lido. As letras querem dizer, simplesmente: “antes de pregar seja bom primeiro”.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
Fonte da imagem: Internet Google.

sábado, 6 de outubro de 2012


CARTA ESTIMULANTE

Diz você, meu amigo, que, depois de haver assistido a alguns trabalhos interessantes de materialização, passou a registrar estranhas modificações no modo de ver.

Assinalou diversas entidades momentaneamente corporificadas, à frente dos olhos, e, pela surpreendente claridade que irradiavam, compreendeu a beleza da vida

Quando os clarões das luzes inexprimíveis se apagaram, retomou quase desacoroçoado, à tarefa comum.

A lembrança das sugestivas revelações perdurava-lhe na memória; entretanto, a via pública pareceu-lhe mais fria e o ambiente doméstico, onde ninguém se lhe afeiçoa as idéias, figurou-se-lhe um cárcere ao pensamento.

No dia seguinte, em retomando o serviço habitual, os companheiros de luta, menos esclarecidos, eram mais duros de suportar.

Deslocara-se-lhe a mente.

À maneira do lenhador que examina uma central elétrica, você passou a sentir o peso do trabalho no carvão comum.

Para que alimentar o fogo a toras de madeira, se há força acessível e eficiente?

Tedioso cansaço assomou-lhe o coração.

E marcou espantado, o vigoroso conflito entre sua alma e a realidade, através de incoercível desajustamento.

Não seria razoável abandonar toda atividade considerada por inferior e partir em busca das claridades de cima? Valeria a pena prosseguir enfrentando o barro da cerâmica em que você trabalha, quando a imortalidade se lhe patenteou indiscutível e brilhante?

Todavia, é forçoso considerar que se a semente pudesse despertar ante a grandeza de uma espiga madura e não se sujeitasse mais ao serviço que lhe compete na cova lodacenta, naturalmente o mundo se privaria de pão.

O plano espiritual, contudo, não pretende instalar a fome ou a ociosidade na Terra.

O Planeta é uma escola em que a inteligência encarnada recebe a lição de que necessita.

Entre a maloca indígena e o castelo civilizado, medeiam muitos séculos de cultura, com experiências vastíssimas e assombrosas, e, entre o palácio dos homens e o santuário dos anjos, há que andar por numerosos séculos ainda...

O Cristianismo que você abraçou, com tanta sinceridade e ternura, permanece repleto de ensinamentos nesse sentido.

Diante do Tabor, em que Espíritos bem-aventurados se materializaram ao lado do Mestre, em transfiguração indescritível, Pedro, deslumbrado, pede para que uma choupana seja ali construída, a fim de que nunca mais regressassem ao mundo vulgar; entretanto, o grande apóstolo é arrebatado de lá, ao torvelinho de ação rotineira, dentro do qual perdeu e venceu várias vezes, sob o tacão de vicissitudes humanas até alcançar a verdadeira exaltação pelo martírio e pelo sacrifício.

Envolve-se Paulo num dilúvio de bênçãos nas vizinhanças de Damasco, mas, ao invés de acompanhar o Cristo magnânimo que o abraça de improviso, é convocado a perambular por muitos anos entre desapontamento e pedradas, no seio da multidão.

Que mais?

O próprio Mestre, no Jardim da prece solitária, sente-se visitado por um anjo divino que desce do firmamento em sublime esplendor; todavia, longe de segui-lo em carro de triunfo para as Esferas Superiores, desce para o cárcere, sofre o insulto da turba ameaçadora, e marcha humilhado para a crucificação.

Não transforme, pois, a excelência do estímulo revelador em desalento para o trabalho natural.

Valores imperecíveis não surgem de imediato.

Tempo e esforço são as chaves do crescimento da alma.

Se os Espíritos elevados reaparecem no intercâmbio dos dois círculos de vida a que nos ajustamos, é que se inspiram no ministério da caridade e desejam acordar os homens para mais altas noções de justiça e fraternidade, a fim de que se fortaleçam e aprimorem, perante a continuidade da vida e da individualidade, além túmulo...

Se você foi chamado às tarefas do oleiro, atenda, quanto possível, ao enriquecimento íntimo, nos estudos e serviços que a nossa Consoladora Doutrina oferece, mas não olvide os tijolos e manilhas, telhas e vasos que a sua indústria foi convidada a materializar.

Institua facilidade e abundância para que os menos favorecidos de recursos e de inteligência consigam construir seus ninhos aos quais se abrigam pobres aves humanas, em peregrinação aflitiva na erraticidade.

Esforce-se para que seu nome seja louvado e abençoado pelos que compram e vendem, pelos que administram e obedecem, convencido de que, se não devemos esquecer a contemplação das estrelas, não encontraremos o caminho de acesso a elas se não acendermos alguma lamparina no chão.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
Fonte da imagem: Internet Google.

sábado, 29 de setembro de 2012


BICHINHOS

Declara-se você esgotado pelos conflitos internos da instituição espírita de que se fez devotado servidor, e revela-se faminto de uma solução para os problemas que lhe atormentam a antiga casa de fé.

Lutas entre companheiros e hostilidades constantes minaram o altar do templo, onde, muitas vezes, você observou a manifestação da Providência Divina, através de abnegados mensageiros da luz, e hoje, ao invés da fraternidade e da confiança, do entusiasmo e da alegria, imperam no santuário a discórdia e a dúvida, o desânimo e a tristeza.

Pede-nos você um esclarecimento, entretanto, a propósito do assunto, lembro-me de velha e valorosa árvore que conheci em minha primeira infância. Verde e forte, assemelhava-se a uma catedral na obra prodigiosa da Natureza. Cheia de ninhos, era o palácio predileto das aves canoras que, em suas frondes, trinavam felizes.

Tropeiros exaustos encontravam a sua sombra, que protegia cristalina fonte, o reconforto e a paz, o repouso e o abrigo. Lenhadores, de quando em quando, furtavam-lhe pedaços vivos e peregrinos ingratos roubavam-lhe ramos preciosos para utilidades diversas.

Tempestades terríveis caíam sobre ela, anualmente, oprimindo-a e dilacerando-a, mas parecia refazer-se, sempre mais bela. Coriscos alcançaram-na em muitas ocasiões, mas a árvore robusta ressurgia sublime. Ventanias furiosas, periodicamente, inclinavam-lhe a copa, decepando-lhe galhos vigorosos; a canícula demorada impunha-lhe pavorosa sede e a enxurrada costumava rodeá-la de pesados detritos...

O tronco, porém, sempre adornado de milhares e milhares de folhas seivosas, parecia inabalável e invencível.

Um dia, contudo, alguns bichinhos começaram a penetrá-la de modo imperceptível.

Ninguém lhes conferiria qualquer significação. Microscópicos, incolores, quase inatingíveis, que mal poderiam trazer ao gigante do solo?

Viajores e servos do campo não lhes identificaram a presença. Mas os bichinhos multiplicaram-se, indefinidamente, invadiram as raízes e ganharam o coração da árvore vigorosa, devorando-o, pouco a pouco...

E o vegetal que superara as ameaças do céu e as tentações da Terra, em reduzido tempo, triste e emurchecido, transformava-se em lenho seco, destinado ao fogo.

Assim também, meu caro, são muitas das associações respeitáveis, quando não se acautelam contra os perigos, aparentemente sem importância.

São admiráveis na caridade e na resistência aos golpes do exterior. Suportam, com heroísmo e serenidade, estranhas provações e contundentes pedradas. Afrontam a calúnia e a maldade, a perseguição e o menosprezo público, dentro de inalterável paciência e indefinível força moral...

Visitadas, entretanto, pelos vermes invisíveis da inveja ou do ciúme, da incompreensão ou da suspeita, depressa se perturbam e se desmantelam; incapazes de reconhecer que os melindres pessoais são parasitas destruidores das melhores organizações do espírito.

Quando o “disse-me-disse” invade uma instituição, o demônio da intriga se incumbe de toldar a água viva do entendimento e da harmonia, aniquilando todas as sementes divinas do trabalho digno e do aperfeiçoamento espiritual.

Que fazer? - pergunta você, assombrado. Dentro da minha nova condição, apenas conheço um remédio: nossa adaptação individual e coletiva à prática real do Evangelho do Cristo. C

ontra os corrosivos bichinhos do egoísmo degradante, usemos os anti-sépticos da Boa Nova. - “Se alguém quiser alcançar comigo a luz divina da ressurreição - disse o Senhor -, negue a si mesmo, tome a cruz dos próprios deveres, cada dia, e siga os meus passos.” Quando pudermos realizar essa caminhada, com esquecimento de nossas carunchosas suscetibilidades, estaremos fora do alcance dos sinistros micróbios da treva, imunizados e tranqüilos em nosso próprio coração.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.

Fonte da imagem: Internet Google.

sábado, 15 de setembro de 2012

BELARMINO BICAS

Depois da festa beneficente, em que servíramos juntos, Belarmino Bicas, prezado companheiro a que nos afeiçoamos, no Plano Espiritual, chamou-me à parte e falou, decidido:

- Bem, já que estivemos hoje em tarefa de solidariedade, estimaria solicitar um favor...

Ante a surpresa que nos assaltou, Belarmino prosseguiu:

- Soube que você ainda dispõe de alguma facilidade para escrever aos companheiros encarnados na Terra e gostaria de confiar-lhe um assunto...

- Que assunto?

- Acontece que desencarnei com cinqüenta e oito anos de idade, após vinte de convicção espírita. Abracei os princípios codificados por Allan Kardec, aos trinta e oito anos de idade, e, como sempre fora irascível por temperamento, organizei, desde os meus primeiros contactos com a Doutrina Consoladora, uma relação diária de todas as minhas exasperações, apontando-lhes as causas para estudos posteriores...

Os meus desconchavos, porém, foram tantos que, apesar dos nobres conhecimentos assimilados, suprimi, inconscientemente, vinte e dois anos da quota de oitenta que me cabia desfrutar no corpo físico, regressando à Pátria Espiritual na condição de suicida indireto...

Somente aqui, pude examinar os meus problemas e acomodar-me às desilusões... Quantos tesouros perdidos por bagatelas! Quanta asneira em nome do sentimento!...

E, exibindo curioso papel, Belarmino acrescentava:

- Conte o meu caso para quem esteja ainda carregando a bobagem do azedume! Fale do perigo das zangas sistemáticas, insista na necessidade da tolerância, da paciência, da serenidade, do perdão!

Rogue aos nossos companheiros para que não percam a riqueza das horas com suscetibilidades e amuos, explique ao pessoal na Terra que mau-humor também mata!...

Foi então que passei à leitura da interessante estatística de irritações, que não me furto à satisfação de transcrever: Belarmino Bicas – Número de cóleras e mágoas desnecessárias com a especificação das causas respectivas, de 1936 a 1956:

1811 em razão de contrariedades em família;

906 por indispor-se, dentro de casa, em questão de alimentação e higiene;

1614 por altercações com a esposa, em divergência na conduta doméstica e social;

1801 por motivo de desgostos com os filhos, genros e nora;

11 por descontentamento com os netos;

1015 por entrar em choque com chefes de serviço;

1333 por incompatibilidade no trato com os colegas;

1012 em virtude de reclamações a fornecedores e lojistas em casos de pouca monta;

614 por mal-entendidos com vizinhos;

315 por ressentimentos com amigos íntimos;

1089 por melindres ante o descaso de funcionários e empregados de instituições diversas;

615 por aborrecimentos com barbeiros e alfaiates;

777 por desacordos com motoristas e passageiros desconhecidos, em viagem de ônibus, automóveis particulares, bondes e lotações;

419 por desavenças com leiteiros e padeiros;

820 por malquistar-se com garçons em restaurantes e cafés;

211 por ofender-se com dificuldades em serviços de telefones;

90 por motivo de controvérsias em casas de diversões;

815 por abespinhar-se com opiniões alheias em matéria religiosa;

217 por incompreensões com irmãos de fé, no templo espírita;

901 por engano ou inquietação, diante de pessoas imaginárias ou da perspectiva de acontecimentos desagradáveis que nunca sucederam.

Total: 16.386 exasperações inúteis.

Esse, o apanhado das irritações do prestimoso amigo Bicas: 16.386 dissabores dispensáveis em 7.300 dias de existência, e, isso, por quatro lustros mais belos de sua passagem no mundo, porque iluminados pelos clarões do Evangelho Redivivo.

Cumpro-lhe o desejo de tornar conhecida a sua experiência que, a nosso ver, é tão importante quanto as observações que previnem desequilíbrios e enfermidades, embora estejamos certos de que muita gente julgará o balanço de Belarmino por mera invencionice de Espírito loroteiro.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito: Irmão X.
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sábado, 1 de setembro de 2012

AMOR E AUXÍLIO

Rolava a conversação em torno de proteção espiritual, quando Jonaquim, respeitado mentor de comunicabilidades cristãs, narrou com a voz aquecida de bondade e sabedoria:

- Ouvi de um instrutor amigo que Mardônio Tércio, convertido ao Cristianismo, nos primeiros dias do Evangelho em Roma, se fêz um discípulo tão valioso e humilde do Senhor que, para logo, teve o seu nome abençoado nos Céus. Patrício de enorme fortuna, desde muito cedo abandonado pela mulher que demandara Cartago para uma vida independente, Mardônio, assim que penetrou a essência da doutrina do Cristo, dividiu todos os bens com o filho único, Marcos Lício, e entregou-se à caridade e à renovação. Instrumento fiel do bem, abria os ouvidos a todos os apelos edificantes, fossem dos mensageiros de Jesus que lhe solicitavam a execução de tarefas benemerentes ou dos irmãos encarnados nos mais baixos degraus da penúria. Fizera-se espontaneamente o apoio das viúvas desamparadas e o tutor afetuoso dos órfãos. Além, disso, mantinha horários, cada dia, para o serviço de assistência direta aos doentes e sofredores, administrando-lhes alimento e socorro com as próprias mãos

Ao contrário do pai, o jovem Marcos se chafurdou em absurda viciação. Aos trinta de idade, parecia um flagelo ambulante. Distinguindo-se entre as forças do ouro e do poder, não vacilava em abusar das regalias que desfrutava para manter-se no banditismo dourado que os privilégios sociais tanta vez conservam impune.

Dois caminhos tão diferentes produziram, em conseqüência, duas posições diametralmente opostas no Mundo Espiritual. Sobrevindo a morte, Mardônio cresceu em tamanho merecimento que foi elevado à esfera do Cristo, acessível aos servidores que pudessem colaborar com ele, o Senhor, nos dias mais torturados do Evangelho nascente.

Marcos, porém, arrojou-se a escuro antro das zonas inferiores, onde, conquanto afeito à revolta e à perversão, qual se trouxesse a consciência revestida em grossa carapaça de insensibilidade.

O genitor, convertido em apóstolo da abnegação, visitava o filho, no vale tenebroso a que se chumbava, sem que o filho, cego de espírito, lhe assinalasse a presença; e tanto se condoeu daquele com quem partilhara o afeto e o sangue que, certo feita, num rasgo de apaixonado amor pelo rebento querido, suplicou ao Senhor permissão para levá-lo consigo para as Alturas, a fim de assisti-lo de mais perto.

Jesus sorriu compreensivo e aquiesceu, diante da ternura ingênua do devotado cooperador, e, antes que amigos experientes lhe administrassem avisos, lá se foi Mardônio para a cava sombria, onde o filho se embriagava de loucura e ilusão... Renteando com Marcos, positivamente distante de qualquer noção de responsabilidade, aplicou-lhe passes magnéticos, anestisiou-lhe os sentidos e, tão logo o beneficiado cedeu ao repouso, colocou-o enternecidamente nos ombros, à feição de carga preciosa, e, com imensos cuidados, transportou-o para os Céus...

Instalado num dos sítios mais singelos do Plano Superior, o recém-chegado, porém, usufruía luz mais radiante que a do dia terrestre, e, tão depressa acordou sob o encantamento paternal, ao ver-se coberto de fluidos repugnantes que lhe davam a impressão de ser um doente empastado de lama enquistada. Marcos se confrontou com os circunstantes, que se moviam em corpos tênues e luminosos, e passou a gritar impropérios e insultos. Ao pai que intentou reconfortá-lo, procurou esbofetear sem misericórdia, afirmando que não pedira e nem desejara a mudança. Exortado a respeitar o nome e a casa do Senhor, injuriou o ambiente com palavras e idéias de zombaria e ingratidão. Parecia uma fera desatrelada, buscando enlamear uma fonte de luz. Interferiram amigos e o rebelado caiu de novo em prostração, sob hipnose benéfica...

Jonaquim fêz novo intervalo, e, porque se interrompera em apontamento culminante da historia, um dos companheiros interrompeu:

- E daí? Mardônio se viu coibido de amparar o filho a quem amava?

O instrutor explicou:

- Sim, meus amigos, Mardônio acabou compreendendo que nem Deus violenta filho algum, em nome do bem, e que o bem jamais foge à paciência, a fim de ajudar...

Por isso, reconduziu Marcos ao antro de onde o arrancara e, sem nada perder em ternura e esperança, até que o filho quisesse ou pudesse de lá sair para novos passos no caminho da evolução, o ex-patrício, por noventa e dois anos consecutivos, desceu diàriamente ao vale das trevas, oferecendo ao filho, de cada vez, a bênção de uma prece, uma frase esclarecedora e um naco de pão.

- Mas, isso não é o mesmo que acentuar a impraticabilidade do socorro? – aventou um dos presentes. – Não seria mais justo relegar o necessitado ao próprio destino para que ele mesmo cogitasse de si?

Jonaquim sorriu expressivamente e rematou:

- Não temos o direito de pôr em dúvida o poder e a eficiência da lei de auxílio. A renovação conseguida por noventa e dois anos de devotamento talvez custasse, sem eles, noventa e dois séculos. O amor, para auxiliar, aprende a repetir.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito: Irmão X.
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sábado, 25 de agosto de 2012

A PETIÇÃO DE JESUS

... E Jesus, retido por deveres constrangedores, junto da multidão, em Cafarnaum, falou a Simão, num gesto de bênção:

- Vai, Pedro! Peço-te! ... Vai à casa de Jeremias, o curtidor, para ajudar. Sara, a filha dele, prostrada no leito, tem a cabeça conturbada e o corpo abatido. Vai sem delonga, ora ao lado dela, e o Pai, a quem rogamos apoio, socorrerá a doente por tuas mãos.

Na manhã ensolarada, pôs-se o discípulo em marcha, entusiasmado e sorridente com a perspectiva de servir. À tarde, quando o sol cedia as últimas posições à sombra noturna, vinha de retorno enunciando inquietação e pesar no rosto áspero.

- Ah! Senhor! - disse ao Mestre que lhe escutava os apontamentos - todo esforço baldado, tudo em vão! ...

- Como assim?

E o apóstolo explicou amargamente, qual se fora um odre de fel a derramar-se:

- A casa de Jeremias é um antro de perdição... Antes fosse um pasto selvagem. O abastado curtidor é um homem que ajuntou dinheiro, a fim de corromper-se. De entrada, dei com ele bebericando vinho num paiol, a cuja porta bati, na esperança de obter informações para demandar o recinto doméstico. Não parecia um patriarca e sim um gozador desavergonhado. Sentava-se na palha de trigo e, de momento a momento, colava os lábios ao gargalo de pesada botelha, desferindo gargalhadas, ao pé de serva bonita e jovem, que se refestelava no chão, positivamente embriagada...

Ao receber-me, começou perguntando quantos piolhos trago à cabeça e acabou mandando-me ao primogênito... Saí à procura de Zoar, o filho mais idoso, e o achei, enfurecido, no jogo de dados em que perdia largas somas para conhecido traficante de Jope. Acolheu-me aos berros, explicando que a sorte da irmã não lhe despertava o menor interesse...

Por fim, expulsou-me aos coices, dando a idéia de uma besta-fera solta no campo. Afastava-me, apressado, quando esbarrei com a dona da casa. Dei-lhe a razão de minha presença; contudo, antes de atender-me, passou a espancar esquelética menina, alegando que a criança lhe havia surrupiado um figo, enquanto a pequena chorosa tentava esclarecer que a fruta havia sido devorada por galos de estimação...

Somente após ensangüentar a vítima, resolveu a megera designar o aposento em que poderia avistar-me com a filha enferma...

Ante o olhar melancólico do ouvinte, o discípulo prosseguiu:

- A dificuldade, porém, não ficou nisso... Visivelmente transtornada por bagatela, a velha sovina errou na indicação, pois entrei numa alcova estreita, onde fui defrontado por Josué, o filho mais moço do curtidor, que mergulhava a mão num cofre de jóias.

Desagradavelmente surpreendido, fêz-se amarelo de raiva, acreditando decerto que eu não passava de alguém a serviço da família, a fim de espionar-lhe os movimentos. Quando ergueu o braço para esmurrar-me, supliquei-lhe considerasse a minha situação de visitante em missão de paz e socorro fraterno. Embora contrafeito, conduzindo-me ao quarto da irmã...

Ah! Mestre, que tremenda desilusão. Não duvido de que se trata de uma doente, mas, logo me viu, a estranha criatura se tornou inconveniente, articulando gestos indecorosos e pronunciando frases indignas... Não agüentei mais... Fugi, horrorizado, e regressei pelo mesmo caminho.

Observando que o Amigo Sublime se resguardava, triste e silencioso, volveu Simão, após comprido intervalo:

- Senhor, não fui, acaso, bastante claro? Porventura, não terei procurado cumprir-te honestamente os desejos? Seria justo, Mestre, pronunciar o nome de Deus, ali, entre vícios e deboche, avareza e obscenidade?

Jesus, porém, depois de fitar longamente o céu, a inflamar-se de lumes distantes, fixou no companheiro o olhar profundamente lúcido e exclamou com serenidade:

- Pedro, conheço Jeremias, a esposa e os filhos, há muito tempo...

Quando te incumbi de ir ao encontro deles, apenas te pedi para auxiliar!

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier – Espírito: Irmão X.
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sábado, 11 de agosto de 2012

A ESTACA ZERO

Denunciando aflitiva expectação, o crente recém-desencarnado dirigia-se ao anjo orientador da aduana celeste, explicando:

– Guardei a maior intimidade com as obras de Allan Kardec que, invariavelmente, mantive por mestre inatacável. Os livros da Codificação vigiavam-me a cabeceira. Devorei-lhes todas as considerações, apontamentos e ditados e jamais duvidei da sobrevivência...

O funcionário espiritual esclareceu, porém, imperturbável:

– Entretanto, o seu nome aqui não consta entre os credores de ascensão às esferas santificadas. Sou, portanto, constrangido a indicar-lhe o regresso à nossa antiga arena de purificação na Crosta da Terra.

– Oh! O corpo! O fardo intolerável!... – suspirou o candidato, evidentemente desiludido.

Cobrou, contudo, novo ânimo e continuou:

– Talvez não me tenha feito compreender. Fui espírita convicto. Desde muito cedo, abracei os princípios sacrossantos da Doutrina que é, hoje, a salvadora luz da Humanidade. Não sòmente Allan Kardec foi o meu instrutor na descoberta da Revelação. Acompanhei as experiências de Zollner e Aksakof, nos setores da física transcendental, com estudos particularizados da fenomenologia mediúnica. Meditei intensivamente para fixar os conhecimentos de que disponho. Flammarion, no original francês, era meu companheiro predileto de noites e noites consecutivas. Em companhia dele, o meu pensamento pervagava nas constelações distantes, prelibando a glória que eu julgava alcançar, além do túmulo. Léon Denis era o mentor de minhas divagações filosóficas. Deleitava-me com os livros dele, absorvendo-lhe as elucidações vivas e sempre novas. E Delanne? Nele, sem dúvida, situei o manancial de minhas perquirições científicas. Estimava confrontar-lhe as observações com os estudos de Claude Bernard, o fisiologista eminente, adquirindo, assim, base legítima para as análises minuciosas. Para não citar apenas os grandes vultos latinos; adianto-lhe que as experiências de Crookes foram carinhosamente acompanhadas por mim, através do noticiário. As comoventes páginas do «Raymond», com que Oliver Lodge surpreendeu o mundo, arrancaram-me lágrimas inesquecíveis. E, a fim de alicerçar pontos de vista, no sólido terreno do espírito, não me contentei com os ocidentais. Consagrei-me às lições dos orientalistas, demorando-me particularmente no exame dos ensinos de Ramakrishna, o moderno iluminado que plasmou discípulos da altura de um Vivekananda. No Brasil, tive a honra de assistir a sessões presididas por Bezerra de Menezes, em minha mocidade investigadora, seguindo, atenciosamente, a formação e a prosperidade de muitos centros doutrinários...

Ante o silêncio do servidor celeste, o precioso estudante fez pequeno intervalo e observou:

– Com bagagem tão grande, acredito que a minha posição de espiritualista deva ser reconhecida.

– Sim – registrou o anjo solícito –, o seu cuidado na aquisição de conhecimento é manifesto. Traz consigo um cérebro vigoroso e bem suprido. Primorosa leitura e teorias excelentes.

– E não me supõe capacitado à travessia da barreira?

– Infelizmente, não. As suas vibrações se inclinam para baixo e você não se mostra preparado a viver em atmosfera mais sutil que a da carne terrestre.

Longe de penetrar o verdadeiro sentido das palavras ouvidas, o crente aduziu:

– E a Bíblia? A intimidade com o Livro Divino, porventura, não me conferira, direito à elevação? De Moisés ao Apocalipse, efetuei deflexões incessantes. Prestei ardoroso culto a David e Salomão, entre os mais velhos, e não se passou um dia de minha existência em que não meditasse na grandeza de Jesus e na sublimidade dos seus ensinamentos. Em meu velho gabinete existem páginas variadas, escritas por mim mesmo, em torno do Evangelho de João, que interpreto como sendo a zona divina do Novo Testamento...

Parando alguns instantes, o recém-desencarnado voltou a inquirir.

– Não julga que a, minha fidelidade as letras sagradas seja passaporte justo à subida?

– Indubitavelmente – respondeu o anjo –, a sua conceituação está repleta de imagens iluminativas. Ainda assim, não posso atentar contra a realidade que me compele a indicar-lhe o retorno para atender aos serviços que lhe cabe realizar.

– Céus! Clamou a interlocutor, desapontado – que fazer então?

– Nesta passagem – explicou-se o cooperador angélico – temos verdadeiro concurso de títulos e esses títulos se expressam aqui pelas obras de cada um. Sem experiência vivida e sem serviço feito, o espírito não vibra nas condições precisas à viagem para o Mais Alto.

O seu retrato mental deixa perceber uma individualidade pujante e valiosa, idêntica, no fundo, a um navio, vasto e bem acabado, cheio de riquezas, utilidades e adornos que nunca se tenha ausentado do porto para a navegação. Em tais condições...

– Entretanto, eu não fiz mal a ninguém...

– Vê-se claramente que o seu espírito é nobre e bem intencionado.

– Então – indagou o crente, semi-exasperado –, qual a minha posição de homem convicto? Que sou? Como estou depois de haver estudado exaustivamente e crido com tanto fervor e tanta sinceridade?

O anjo, triste talvez pela necessidade de ser franco, elucidou, sem hesitar:

– A sua posição é invejável, comparada ao drama inquietante de muita gente. Demonstra uma consciência quitada com a Lei. Não tem compromissos com o mal e revela-se perfeitamente habilitado à excursão nos domínios do bem. Em se tratando, contudo, de ascensão para o Céu, observo-lhe o coração na estaca zero.

Ninguém se eleva sem escada ou sem força. O meu amigo sabe muito. Agora, é preciso fazer...

E ante o sorriso reticencioso do funcionário celestial, o interlocutor nada mais aduziu, entrando, ali mesmo, em profundo silêncio.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X
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terça-feira, 31 de julho de 2012

A CARIDADE MAIOR

Ao Homem que alcançara o Céu, pedindo orientação sobre as tarefas de benemerência social que pretendia estender na Terra, o Anjo da Caridade falou compassivo:

– Volta ao mundo e cumpre, de boa vontade, as obrigações que o destino te assinalou!...

Para que te sintas de pé, cada dia, milhões de vidas microscópicas esforçam-se em tua carne, garantindo-te a bem-estar...

Cada órgão e cada membro de teu corpo amparam-te, abnegadamente, para que te facas abençoado discípulo da civilização.

Os olhos identificam as imagens que já podes perceber, livrando-te da desordem interior.

Os ouvidos selecionam sons e vozes para que não vivas desorientado.

A língua auxilia-te a expressar os pensamentos, enriquecendo-te de sabedoria.

As mãos realizam-te os sonhos, engrandecendo-te o caminho na ciência e na arte, no progresso e na indústria.

Os pés sustentam-te a máquina física para que te não arrojes à inércia.

A boca mastiga os alimentos para que te não condenes à inação.

Os pulmões asseguram-te o ar puro contra a asfixia.

O estômago digere as pegas com que nutrirás próprio sangue.

O fígado gera forças vitais que te entretêm a harmonia orgânica.

O coração movimenta-se sem parar, escorando-te a existência.

Vives da caridade de inúmera vidas inferiores que te obedecem a mente.

Torna, pois, ao lugar em que o Senhor te situou e satisfaze as tarefas imediatas que o mundo te reserva!...

Caridade é servir sem descanso, ainda mesmo quando a enfermidade sem importância te convoque ao repouso;

é cooperar espontaneamente nas boas obras, sem aguardar o convite dos outros;

é não incomodar quem trabalha;

é aperfeiçoar-se alguém naquilo que faz para ser mais útil;

é suportar sem revolta a bílis do companheiro;

é auxiliar os parentes, sem reprovação;

é rejubilar-se com a prosperidade do próximo;

é resumir a conversação de duas horas em três ou quatro frases;

é não afligir quem nos acompanha;

é ensurdecer-se para a difamação;

é guardar o bom-humor, cancelando a queixa de qualquer procedência;

é respeitar cada pessoa e cada coisa na posição que lhes é própria...

E por que o Homem ensaiasse inoportunas indagações, o Anjo concluiu:

– Volta ao corpo e age incessantemente no bem!...

Não percas um minuto em descabidas inquirições. Conduze os problemas que te atormentam o espírito ao teu próprio trabalho e o teu próprio trabalho liquidá-los-á...

A experiência aclara o caminho de quantos lhe adquirem o tesouro de luz. Recolhe as crianças desvalidas, ampara os doentes, consola os infelizes e socorre os necessitados. Não olvides, pois, que a execução de teus deveres para com o próximo será sempre a tua caridade maior.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
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sábado, 14 de julho de 2012

PERU PREGADOR

Um belo peru, após conviver largo tempo na intimidade duma família que dispunha de vastos conhecimentos evangélicos, aprendeu a transmitir os ensinamentos de Jesus, esperando-lhe também as divinas promessas. Tão versado ficou nas letras sagradas que passou a propagá-las entre as outras aves.

De quando em quando, era visto a falar em sua estranha linguagem “glá-glé-gli-gló-glu”. Não era, naturalmente, compreendido pelos homens. Mas os outros perus, as galinhas, os gansos e os marrecos, bem como os patos, entendiam-no perfeitamente.

Começava o comentário das lições do Evangelho e o terreiro enchia-se logo. Até os pintainhos se aquietavam sob as asas maternas, a fim de ouvi-lo.

O peru, muito confiante, assegurava que Jesus Cristo era o Salvador do Mundo, que viera alumiar o caminho de todos e que, por base de sua doutrina colocara o amor das criaturas umas para com as outras, garantindo a fórmula de verdadeira felicidade na Terra. Dizia que todos os seres, para viverem tranqüilos e contentes, deveriam perdoar aos inimigos, desculpar os transviados e socorrê-los.

As aves passaram a venerar o Evangelho; todavia, chegado o Natal do Mestre Divino, eis que alguns homens vieram aos lagos, galinheiros, currais e, depois de se referirem excessivamente ao amor que dedicavam a Jesus, laçaram frangos, patinhos e perus, matando-os ali mesmo, ante o assombro geral.

Houve muitos gritos e lamentações, mas os perseguidores, alegando a festa do Cristo, distribuíram pancadas e golpes à vontade.

Até mesmo a esposa do peru pregador foi também morta.

Quando o silêncio se fez no terreiro, ao cair da noite, havia em toda a parte enorme tristeza e irremediável angústia de coração.

As aves aflitas rodearam o doutrinador e crivaram-no de perguntas dolorosas.

Como louvar um Senhor que aceitava tantas manifestações de sangue na festa de natalício? Como explicar tanta maldade por parte dos homens que se declaravam cristãos e operavam tanta matança? Não cantavam eles hinos de homenagem ao Cristo? Não se afirmavam discípulos d´Ele? Precisavam, então, de tanta morte e tanta lágrima para reverenciarem o Senhor?

O pastor alado, muito contrafeito, prometeu responder no dia seguinte. Achava-se igualmente cansado e oprimido. Na manhã imediata, ante o Sol rutilante do Natal, esclareceu aos companheiros que a ordem de matar não vinha de Jesus, que preferira a morte ao madeiro a ter de justiçar, que deviam todos eles continuar, por isso mesmo, amando o Senhor e servindo-o, acrescentando que lhes cabia perdoar setenta vezes sete.

Explicou por fim, que os homens degoladores estavam anunciados no versículo quinze do capítulo sete, do Apóstolo Mateus, que esclarece – “Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas, que vêm até vós vestidos como ovelhas, mas interiormente são lobos devoradores”.

Em seguida, o peru recitou o capítulo cinco do mesmo evangelista, comentando as bem-aventuranças prometidas pelo Divino Amigo aos que choram e padecem no mundo.

Verificou-se, então, imenso reconforto na comunidade atormentada e aflita, porque as aves se recordaram de que o próprio Senhor, para alcançar a Ressurreição Gloriosa, aceitara a morte de sacrifício igual à deles.

Livro: Alvorada Cristã – Médium: Chico Xavier – Espírito: Néio Lúcio.
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sábado, 16 de junho de 2012

A LIÇÃO DO ESSENCIAL

Discorriam os discípulos, entre si, quanto às coisas essenciais ao bem-estar, quando o Senhor, assumindo a direção dos pensamentos em dissonância, acrescentou:

— É indispensável que a criatura entenda a própria felicidade para que se não transforme, ao perdê-la, em triste fantasma da lamentação.

Longe das verdades mais simples da Natureza, mergulha-se o homem na onda pesada de fantasiosos artifícios, exterminando o tempo e a vida, através de inquietações desnecessárias.

E como quem recordava incidente adequado ao assunto, interrompeu-se por alguns instantes e retomou a palavra, comentando: — Ilustre dama romana, em companhia dum filhinho de cinco anos, dirigia-se da cidade dos Césares para Esmirna, em luxuosa galera de sua pátria.

Ao penetrar na embarcação, fizera-se acompanhar de dois escravos, carregados de volumosa bagagem de jóias diferentes: colares e camafeus, braceletes e redes de ouro, adornados com pedrarias, revelavam-lhe a predileção pelos enfeites raros.

Todo o pessoal de serviço inclinou-se, com respeito, ao vê-la passar, tão elevada era a expressão do tesouro que trazia para bordo.

Tão logo se fez o barco ao mar alto, a distinta senhora converteu-se no centro das atenções gerais.

Nas festas de cordialidade era o objetivo de todos os interesses pelos adornos brilhantes com que se apresentava.

A excursão prosseguia tranqüila, quando, em certa manhã ensolarada, apareceu o imprevisto.

O choque em traiçoeiro recife abre extensa brecha na galera e as águas a invadem.

Longas horas de luta surgem com a expectativa de refazimento; entretanto, um abalo mais forte leva o navio à posição irremediável e alguns botes descidos são colocados à disposição dos viajantes para os trabalhos de salvamento possível.

A ilustre patrícia é chamada à pressa.

O comandante calcula a chegada a porto próximo em dois dias de viagem arriscada, na hipótese de ventos favoráveis.

A jovem matrona abraça o filhinho, esperançosa e aflita.

Dentro em pouco ela atinge o pequeno barco de socorro, sustentando a criança e pequeno pacote em que os companheiros julgaram trouxesse as jóias mais valiosas.

Todavia, apresentando o conteúdo aos poucos irmãos de infortúnio que seguiriam junto dela, exclamou:

— “Meu filho é o que possuo de mais precioso e aqui tenho o que considero de mais útil”.

O insignificante volume continha dois pães e dez figos maduros, com os quais se alimentou a reduzida comunidade de náufragos, durante as horas aflitivas que os separavam da terra firme.

O Mestre repousou, por alguns segundos, e acrescentou: — A felicidade real não se fundamenta em riquezas transitórias, porque, um dia sempre chega em que o homem é constrangido a separar-se dos bens exteriores mais queridos ao coração.

Os loucos se apegam a terras e moinhos, moedas e honras, vinhos e prazeres, como se nunca devessem acertar contas com a morte.

O espírito prudente, porém, não desconhece que todos os patrimônios do mundo devem ser usados para nosso enriquecimento na virtude e que as bênçãos mais simples da Natureza são as bases de nossa tranqüilidade essencial.

Procuremos, pois, o Reino de Deus e sua justiça, tomando à Terra o estritamente necessário à manutenção da vida física e todas as alegrias ser-nos-ão acrescentadas.

Livro: Jesus no Lar, lição 44 - Médium: Chico Xavier – Espírito: Néio Lúcio.
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