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domingo, 16 de dezembro de 2012


EM TORNO DA PAZ

O relógio tilintou, marcando oito horas, quando Anacleto Silva acordou na manhã clara.

Lá fora, o Sol prometia calor mais intenso e a criançada disputava bagatelas como vaga chilreante de passarinhos.

Anacleto estirou-se no leito, relaxando os nervos, e, porque iniciaria o trabalho às nove, antes de erguer-se tomou o Evangelho e leu nos apontamentos do Apóstolo João, capítulo catorze, versículo vinte e sete, as sublimes palavras do Celeste Amigo:

A paz vos deixo, a minha paz vos dou. Não vo-la dou à maneira do mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize.

- “Alegro-me na certeza de que a paz do Senhor envolve o mundo inteiro”. Onde estiver, receberei o amor do Cristo, que assegura a tranquilidade, em torno do meu caminho.

Sei que a presença de Jesus abrange toda a Terra e que a sua influência nos governa os destinos.

Desfrutarei, assim, a paz entre as criaturas.

O Eterno Benfeitor está canalizando todas as mentes para a vitória da paz. Por isso, ainda mesmo que os homens me ofendam, neles procurarei enxergar meus irmãos que o Divino Poder está transformando para a harmonia geral.

Regozijo-me na convicção de que o Príncipe da Paz orienta as nações e que, desse modo, me garantirá o bem-estar.

Recolherei do Céu a bênção da calma e permanecerei nos alicerces do entendimento e da retidão, junto da Humanidade.

Louvo o Senhor pela paz que me envia hoje, esperando que Ele me sustente em sua paz, agora em todos os dias de minha vida.

Após monologar, fervoroso, levantou-se feliz, mas, findo o banho rápido, verificou que a fina calça com que lhe cabia comparecer no escritório sofrera longo corte de faca.

Subitamente transtornado, chamou pela esposa, em voz berrante.

Dona Horacina veio, aflita, guardando nos braços uma pequerrucha doente. Viu a peça maltratada e alegou triste:

- Que pena! Os meninos estão à solta, e eu ocupada com a pneumonia da Sônia.

Longe de refletir na grave enfermidade da filhinha de meses, Anacleto vociferou:

- Que pena? É tudo o que você encontra para dizer? Ignora, porventura, que esta roupa me custou os olhos da cara?

A senhora, sem revidar, dirigiu-se a velho armário e trouxe-lhe um costume semelhante ao que fora dilacerado.

Pouco depois, ao café, notando a ausência do leite, Anacleto reclamou, irritadiço.

- Sim, sim – explicou a dona da casa -, não pude enfrentar a fila... Era preciso resguardar a pequena...

Silva engoliu alguns palavrões que lhe assomavam à boca e, quando abriu a porta, na expectativa do lotação, eis que o sogro, velhinho, lhe aparece, de chapéu à destra encarquilhada, rogando, humildemente:

- Anacleto, perdoe-me a intromissão; contudo, é tão grande a nossa dificuldade hoje em casa que venho pedir-lhe quinhentos cruzeiros por empréstimo...

- Ora, ora... – respondeu o genro, evidenciando cólera injusta – onde tem o senhor a cabeça? Se eu tivesse quinhentos cruzeiros no bolso, não sairia agora para encarar a onça da vida.

Nisso um carro buzinou à reduzida distância, passando, porém, de largo, sem atender-lhe ao sinal.

- Malditos! Como seguirei para a repartição? Malditos! Malditos!...

Outro carro, no entanto, surgiu rápido, e Silva acomodou-se, enfim.

Mas, enquanto o veículo deslizava no asfalto, confrontou a própria conduta com as afirmações que fizera ao despertar, e só então reconheceu que ele, tão seguro em exaltar a harmonia do mundo, não suportara sem guerra uma calça rasgada; tão convicto em prometer a si mesmo o equilíbrio no Senhor, não se conformara ante a refeição incompleta; tão pronto em proclamar o seu prévio perdão às ofensas humanas, não soubera acolher com gentileza a solicitação de um parente infeliz, e tão solene em asseverar-se nos alicerces do entendimento, não hesitara em descer da linguagem nobre para a que condiz com a gíria que amaldiçoa...

E, envergonhado por haver caído tão apressadamente da serenidade à perturbação, começou a perceber que, entre ele e a Humanidade, surgia o lar, reclamando-lhe assistência e carinho, e que jamais receberia a paz do Cristo por fora, sem se dispor a recolhê-la por dentro.

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
Fonte da imagem: Internet Google.

sábado, 1 de dezembro de 2012


CURIOSA EXPERIÊNCIA

João Massena, espírito extremamente dedicado aos enfermos, desde alguns anos após a desencarnação dirigia um grupo de companheiros em grande cidade, esmerando-se na plantação das ideias libertadoras do Espiritismo.

Respeitado e querido, entre aqueles que lhe recebiam a generosidade, ampliava constantemente a própria área de ação, invocado carinhosamente, aqui e ali, prestava serviços preciosos, angariando tesouros de cooperação e simpatia.

Aplicava o Evangelho, com raro senso de oportunidade, sustentava infelizes, protegia desesperados e sabia orientar o concurso de vários médicos desencarnados, em favor dos doentes, especializando-se, sobretudo, no socorro aos processos obsessivos.

Massena apoiava o grupo de amigos encarnados e o grupo apoiava Massena, com tal segurança de entendimento e trabalho, que prodígios se realizavam constantemente.

As tarefas continuavam sempre animadoras, quando surgiu para João certo caso aflitivo. Jovem destinada a importantes edificações mediúnicas jazia em casa, trancada entre quatro paredes e vigiada por Espíritos impossíveis, interessados em cobrar-lhe algumas dívidas do passado culposo. Benfeitores da Vida Maior amparavam-na; perseguidores que lhe tramavam a perda.

Prestigiado pelos poderes Superiores, Massena estudou a melhor maneira de acordá-la para as responsabilidades de que se achava investida e percebeu que, para isso, bastaria aparecesse alguém capaz de lhe excitar a memória para o retorno ao equilíbrio, alguém que falasse a ela com respeito à fé raciocinada, à crença lógica, à imortalidade da alma e à vida espiritual.

A jovem, contudo, sob a provação da riqueza amoedada, sofria a desvantagem de não precisar sair do estreito recinto doméstico e, à face disso, encontrava maior empeço para largar a si própria.

A pouco e pouco, dominada por entidades vampirizadoras, entregou-se ao vício do álcool e, quase anulada que lhe foi a resistência, permitiu que essas mesmas criaturas perturbadas lhe assoprassem a sugestão de um crime a ser perpetrado na pessoa de um parente próximo.

Conquanto reagisse, a pobrezinha estava quase cedendo à insanidade, à delinquência.

João, aflito, reconheceu o estado de alarma. A moça, no entanto, não se ausentava de casa, não recebia visitas, não recorria a leituras e ignorava o poder da prece.

Mentalmente intoxicada, tomava rumo sinistro, quando Massena descobriu algo. A infortunada menina gostava de televisão, que se lhe fizera o único meio de contato com o mundo exterior.

Porque não auxiliá-la através de semelhante recurso?

O abnegado amigo espiritual pôs-se em campo e, repartindo apelos mentais, em setores diversos, conseguiu articular providências, até que um amigo lhe aceitou a inspiração e veio ao grupo com um projeto entusiástico. Esse “projeto entusiástico” não era outra coisa senão o interesse de Massena no salvamento da jovem.

E o visitante, sob o influxo dele, fez-se veemente no tranquilo cenáculo, convidando o conjunto a aproveitar uma oportunidade que obtivera em determinado canal. Conseguira vinte minutos para assunto espírita numa televisora respeitável.

O grupo representar-se-ia, por alguns dos componentes mais categorizados, daí a quatro dias – uma sexta-feira às dez da noite -, para comentar ligeiros aspectos de mediunidade e Doutrina Espírita.

O ofertante, após anotações de jubiloso otimismo, concluiu explicando que necessitava de ajustes urgentes. Queria de imediato, o nome do companheiro decidido a falar, antes de atender a instruções de autoridades e estabelecer minudências.

Os nove companheiros, ali reunidos, não sintonizavam, porém, naquela onda de expectação fervorosa.

Lara, o diretor de maior responsabilidade, ponderou:

- Ora! Ora! O Espiritismo não precisa de televisão. Temos as nossas casas de ensino... Entretanto, coloco o assunto ao critério dos irmãos...

O recém-chegado, expressando-se por si e pelo benfeitor espiritual que o envolvia em pensamentos de esperança, ripostou:

- Sem dúvida, o templo espírita é o lar da palavra doutrinária, mas isso não nos impede de comentar os princípios espíritas, em benefício da Humanidade, seja no rádio ou na imprensa, na rua ou no salão. Se fôssemos falar acerca do bem apenas nos instintos de fé religiosa, deixaríamos ao mal campo livre, terrivelmente livre...

O judicioso apontamento, contudo, não vingou.

Delcides, comentarista inteligente da equipe, aduziu:

- Sou contra. Eu não iria à televisão, de modo algum. Considero isso pura vaidade.

Antônio Pinho, orador competente, anuiu:

- De minha parte, não tenho coragem de me entregar a semelhante exibição...

Meira, verbo seguro e visão firme, comentou, seco:

- Nem eu.

E os demais cinco ajuntaram:

- Decididamente, ir à televisão falar de Espiritismo não está certo...

- Penso de igual modo. Quem quiser aprender Doutrina Espírita, venha às reuniões...

- Eu também não poderia concordar...

- Não sou de teatro...

- O assunto esta fora de cogitação...

Encerrou-se o entendimento e o ofertante afastou-se, desapontado.

Curiosos, visitamos a jovem obsidiada, justamente na data para a qual Massena lhe previa o suspirado auxílio. Eram dez horas da noite, na sexta-feira referida, e fomos achá-la sentada à frente do vídeo.

Os minutos que seriam reservados aos comentários em torno do Espiritismo estavam sendo aplicados num festivo programa de exaltação ao uísque e, perplexos, fitamos o simpático sorriso de tele-atriz que convidava:

- Beba a nova marca! Uma delícia!...

Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
Fonte da imagem: Internet Google.